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terça-feira, 25 de outubro de 2011

3000 léguas caminhei...

Embora tentador, eu decidira não ir. A agenda estava cheia, teriam muitos shows pela frente.

Há pouco tempo eu terminara um trabalho e podia acordar tarde nos próximos dias. Eu lia "Viajante solitário" do Jack Kerouac/L&PM durante a madrugada: "MEUS AMIGOS E EU temos uma maneira especial de nos divertirmos em Nova York sem gastar muita grana e principalmente sem sermos importunados por chatos formalistas (...) Vagabundos sem rumo como crianças". Assim falava-me a página 133 do livro.

Já passava das 4h30min da manhã e eu não conseguia dormir. Apaguei a luz, mudei o travesseiro, abri e fechei a janela. Nada de sono. Peguei o notebook outra vez e comecei a navegar em sites de companhias aéreas. Ainda havia lugares para alguns voos de logo mais, na manhã de sexta. Achei loucura, não era prudente sair sem planos, o que eu ia dizer em casa? Achei a minha cara! Comprei a passagem. Só de ida. O porque eu não sei, mas me senti feliz e completa. Consegui dormir.

Acordei em cima da hora (típico de mim) e arrumei a mala - leia-se mochila - em menos de 10 minutos. No aeroporto Salgado Filho, a Presidenta Dilma saia rodeada de seguranças, jornalistas e curiosos, enquanto eu, entrava sozinha. O voo foi direto à Confins/MG. Desembarquei e pensei: e agora? Agir e depois pensar não é aconselhável, ok? Mas parecia tão certo fazer as coisas daquela maneira. Tenho vivido dias intensos em busca de desvendar o significado de LIBERDADE. Tatuei a frase "Você precisa ser livre" (de uma canção do Nenhum) no braço como representação da vontade de descobrir mais sobre mim mesma e sobre o universo diante de meus olhos. Tento não me prender à amarras ou conceitos. É um lance de sentir o vento batendo na cara, sabe? Sem exageros.

Acabou a bateria do celular. Eu não tinha como ligar para ninguém. Me restou ir atrás de informações de como chegar na cidade de... eu não lembrava mais o nome de onde teria show naquela noite. Tive que dar uma risada interna. Aproveitei e tomei um café no aeroporto antes de ir para Belo Horizonte, pois eu sabia que somente de lá seria possível partir para algum outro lugar. Eu andava, muito concentrada pensando no que fazer, quando alguns integrantes da banda me encontraram. Muito legal isso! Acho que tais coincidências emanam energias positivas.

Chamou minha atenção a quantidade de focos de queimadas por onde passava. Cheguei a pensar que poderia ser alguma técnica de plantio, mas depois soube que não chovia há meses na região. E é gritante o desgaste da vegetação e no clima.

Conselheiro Lafaiete ficava há uma hora de BH. Embora não muito grande, tem sua estrutura urbana bem desenvolvida e vários hotéis, pois o município recebe crescente número de pessoas que viajam a trabalho. O show aconteceu num clube espaçoso e bonito! No início o público parecia quieto e me senti um pouco deslocada. O Thedy começou a interagir bastante e, no decorrer da noite, estavam todos dançando. Foi bem bacana! Mais bacana ainda foi quando eles me viram na platéia e o Veco me jogou um beijo. Aí já me valeu a viagem toda! Eles não imaginam, mas um aceno, uma resposta ainda que pequena, faz um fã explodir de emoção. E quando falo FÃ, me refiro aqueles que curtem de coração. E o Nenhum de Nós tem muitos fãs pra valer porque nos tratam com muito respeito e, por que não dizer, CARINHO. Acho que nós, admiradores profundos da banda, somos "mimados" demais por esses caras. Como se diz em Minas: "Êêê, trem bom!"

No sábado, aproveitei para passear pela encantadora Belo Horizonte. Na rodoviária oferece-se um guia, uma espécie de mapinha, com os principais atrativos do Centro. Adorei suas ruas e praças, inclusive, identifiquei semelhanças com Porto Alegre. Foi uma tarde de compras, lindas fotos e, claro, pão-de-queijo. O dia sumia entre estrelas e ainda havia uma estrada longa até Divinópolis. Seguiu-se pouco mais de duas horas com a rodovia bastante movimentada.

Em Divinópolis... bah, ou melhor, "uai"! Sem palavras!!! Além de ser muito bom reencontrar as amigas, foi uma das mais emocionantes apresentações que já curti do grupo em termos de VIBRAÇÃO. O pessoal cantou absolutamente TODAS as músicas com muita paixão. Ninguém queria que eles deixassem o palco. Nossa! Esses mereciam um show de 3 horas! Foi muito especial estar ali compartilhando uma alegria quase que sólida.

Que povo mais simpático! Os mineiros me deixaram encantada. Pessoas muito bem humoradas e educadas na sua maioria. Não vejo a hora de voltar... Sentimento louco que acontece com a gente que viaja seguido. Às vezes, rola uma "paixonite" por algum lugar. Dá vontade de não sair mais de lá.

Quase de manhã voltamos para o hotel e ficamos bebendo mais uma (ou duas) cerveja antes de subir. E pensávamos em ir ou não para o show de domingo. Seriam duas horas dirigindo até Belo Horizonte e depois mais três horas até Coronel Fabriciano. Era arriscado, pensei. Como não conheço a rodovia, não insisti. Confesso: fiz algumas vezes aquela carinha de Natal... Mas como adultas responsáveis que somos, decidimos não ir. Nos despedimos da banda e eu fiquei para tomar café e dormir depois. Adorei comer um queijo-minas em Minas! Aliás, em todos os hotéis que passei em MG os cafés foram "porreta". Num sono profundo, perto de 8 horas, alguém batia na porta. Era uma das gurias, me avisando que ia a um hospital da cidade. Fiquei assustada e ela disse para não me preocupar. Como minha cabeça ainda sentia os efeitos da bebida dos dias anteriores e o corpo já dava evidentes sinais de cansaço, logo esqueci e dormi outra vez. Às 11 horas, conforme combinado, me chamaram. Acordei sem vontade, me organizei rapidamente e desci, pronta para ir à BH e curtir um dia tranquilo e sereno antes de voltar para o Sul... Ledo engano!!! Olha que já vi de tudo, mas não acreditei quando o trio que me aguardava perguntou: "- Pronta para encarar uma viagem até Coronel Fabriciano?". Não podia ser. E o perigo da estrada? E o hospital? Eu estava bêbada ainda? Era um sonho? Nada disso! Falavam muito sério. "uma simples questão de ir ou de ficar..." Voltei ao quarto e troquei de roupa... On the road...

O Contos de Água e Fogo foi nosso companheiro na empreitada rumo a cidade que nenhuma de nós havia pisado antes. Não sabíamos ao certo quais placas obedecer, se era a rota certa. Mas a realidade da gente é assim, nem sempre se sabe no que vão dar as escolhas. Com este estilo de vida que escolhi aprendi que o importante é mirar um destino e ir em frente sem medo. E assim seguimos. Contando histórias, descobrindo novas músicas, trocando experiências e risadas que nunca acabam.  O achado mais incrível: acetona sabor tutti-frutti. E a pergunta que não calou: "Para quê serve uma acetona com sabor?" hahahaha. O caminho foi bom. Se eu ainda tinha alguma dúvida de que deveria estar alí, acabou de vez entre as curvas de um asfalto mal cuidado. Eu era tipo, um animalzinho que foge do zoo e encontra seu habitat natural. Tudo estava em seu devido lugar.

Chegamos a uma cidade pequena e a mais humilde do trajeto. O espetáculo foi na praça, aberta e lotada. Estávamos bem cansadas e a melancolia da despedida já brisava sobre nós. Saudade querendo avisar que vai aparecer em breve.

No hotel lembro do Thedy me perguntar se tinha valido a pena, e SIM foi a resposta. Na verdade, não há como dizer o quanto valeu. É daquelas coisas que, talvez, só desenhando se possa explicar...

Tarde de segunda-feira, eu com alguns integrantes da banda novamente no aeroporto. Meu voo era mais tarde. Voltei de olhos fixos na janela, como a dar um abraço de despedida no estado que me deu um final de semana ímpar. Lembrarei para sempre!

Piso em Porto Alegre, descanso e penso: - SEMPRE VALE A PENA!!!